A luta por território é uma das questões mais sensíveis e históricas enfrentadas pelos povos indígenas e comunidades tradicionais no Brasil. O direito à terra está diretamente ligado à identidade, à sobrevivência cultural e à dignidade desses povos. No entanto, o processo de demarcação de terras indígenas e quilombolas tem enfrentado avanços e retrocessos marcados por interesses políticos, econômicos e sociais.
📍 O que é a demarcação de terras?
A demarcação é o processo administrativo que reconhece oficialmente uma área como pertencente a um povo indígena ou quilombola, garantindo sua posse permanente e o uso exclusivo dos recursos naturais ali existentes. Este procedimento é um direito assegurado:
- Aos povos indígenas pela Constituição Federal de 1988 (Art. 231 e 232).
- Aos quilombolas pelo Art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT).
Sem essa garantia legal, essas comunidades ficam vulneráveis à invasão de madeireiros, grileiros, garimpeiros e ao avanço do agronegócio.
⚖️ Por que a luta por território é tão importante?
A terra, para esses povos, não é apenas um meio de produção, mas um espaço sagrado e coletivo, onde se desenvolvem modos próprios de vida, saberes, culturas e práticas ancestrais.
➡️ Sem território, não há como manter a autonomia cultural, espiritual e alimentar.
➡️ A luta pela terra é também uma luta contra o etnocídio – o apagamento sistemático de culturas.
🚧 Retrocessos políticos e ameaças recentes
Nas últimas décadas, especialmente entre 2016 e 2022, o Brasil vivenciou uma onda de retrocessos em políticas de proteção territorial:
1. Paralisação de processos demarcatórios
Durante esse período, nenhuma nova terra indígena foi demarcada. A Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) sofreu cortes orçamentários e pressões políticas.
2. Marco Temporal
A tese do Marco Temporal, julgada no STF, tenta restringir o direito à terra apenas às comunidades que a ocupavam em 5 de outubro de 1988 (data da promulgação da Constituição), ignorando expulsões forçadas e violências prévias.
❗ O STF rejeitou essa tese em 2023, mas o Congresso aprovou uma lei (Lei 14.701/2023) a favor do marco, gerando insegurança jurídica.
3. PLs e PECs contra os direitos territoriais
Projetos como o PL 490/2007 (atual Marco Temporal) e propostas de emenda constitucional ameaçam reduzir os direitos conquistados pelas populações tradicionais.
✅ Avanços e resistências
Apesar dos retrocessos, houve mobilização e resistência por parte dos povos indígenas e da sociedade civil:
- A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) desempenha papel essencial na defesa de direitos e articulação política.
- Em 2023, o Brasil voltou a demarcar terras indígenas, como a TI Uneiuxi (AM) e TI Avá-Canoeiro (GO).
- A criação do Ministério dos Povos Indígenas, em 2023, simbolizou um novo momento institucional de escuta e protagonismo indígena.
🌿 Impactos das demarcações
A demarcação garante proteção ambiental, pois os territórios indígenas e quilombolas preservam ecossistemas inteiros. Estudos mostram que as áreas indígenas são as mais preservadas da Amazônia, contribuindo para o combate ao desmatamento e às mudanças climáticas.
Além disso, essas demarcações reduzem conflitos agrários e violências no campo, proporcionando segurança jurídica às comunidades.
📘 Conclusão
A luta por território é uma luta por existência, memória, justiça e futuro. Cada avanço na demarcação é uma vitória histórica. Cada retrocesso político ameaça não apenas os povos diretamente afetados, mas também toda a sociedade brasileira, que perde biodiversidade, cultura e democracia.
🔎 Referências
- Constituição Federal de 1988, Art. 231 e 232.
- ADCT – Artigo 68.
- Supremo Tribunal Federal – Julgamento do Marco Temporal (2023).
- APIB – Articulação dos Povos Indígenas do Brasil: https://apiboficial.org
- Instituto Socioambiental (ISA): https://socioambiental.org
- FUNAI – Fundação Nacional dos Povos Indígenas: https://www.gov.br/funai
- Greenpeace Brasil. “Demarcação de Terras Indígenas ajuda a proteger o meio ambiente”.
- OXFAM Brasil – Relatórios sobre desigualdade fundiária.
- Comissão Pastoral da Terra (CPT) – Relatórios de conflitos no campo.